CATÁSTROFE

May 28, 2018

Domingos de Carvalho relacionava-se com escritores do grupo neo-realista que encontrava na livraria Portugal, ao Chiado e num café, também chamado Portugal, da rua Primeiro de Dezembro e levava algumas vezes o filho consigo. Escreveu um livro de poemas, «Joio Sem Trigo» que teve uma boa aceitação. Mas logo o livro foi apreendido pela polícia política. O mesmo viria a acontecer com outros dois livros.

Havia em volta um clima de permanente ameaça. O pai mudava frequentemente de aspecto, talvez com alguma ingenuidade, pois era um comerciante estabelecido e conhecido nos meios da Baixa de Lisboa. Apareciam desconhecidos lá por casa, que às vezes ficavam para dormir e se mostravam pouco expansivos. Mais tarde soube que um dos alojados tinha sido o professor Ruy Luís Gomes, antigo candidato à Presidência da República pela Oposição Democrática.

Na campanha presidencial de 1958, Domingos Carvalho envolveu-se activamente no apoio ao general. Em 1959 seria preso, sujeito à tortura do sono e levado a julgamento no tribunal plenário.

As circunstâncias desta prisão, o lado soturno e deprimente da cadeia do Aljube, o desespero de uma vida que se viu seriamente abalada (mas também a solidariedade arriscada dos amigos) ficaram profundamente marcados na memória de MdC.